- Livre
para ser Preso? Ora, somente quem está livre pode acabar preso.
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Trata-se de um raciocínio lógico, realmente.
Trata-se de um raciocínio lógico, realmente.
No entanto, no momento em que você decidir se
aventurar pelas páginas que seguem esta apresentação, entenderá exatamente o
que o autor, que assina sob o pseudônimo Afobório e usa uma balaclava enfiada
na cabeça, quis dizer com este título, aparentemente contraditório.
É a história de Alencar, fazendeiro truculento e
amargo que viu a esposa o trair com o frentista de um posto de gasolina e
morrer bebendo conhaque.
E de Jorge, fugitivo da polícia, apaixonado por
uma boneca chamada Cindy e que traz consigo a crença de que não é um homem, mas
uma onça.
São estes dois personagens que protagonizarão
uma caçada alucinante mata adentro, um tentando provar ao outro onde,
exatamente, se concentra sua força e sua fúria; sua humanidade e sua
bestialidade; sua sobrevivência e sua extinção.
Enquanto lia os originais desta obra, por
diversas vezes me peguei embrulhada, enjoada, desconfortável.
Diversas vezes precisei parar para retomar meu
fôlego, e me certificar de que o mundo lá fora não havia se transformado em uma
perseguição convulsiva e furiosa, onde homens se confundem com bestas feras e
sentimentos se viram ao avesso, para comprovar o que todos nós sabemos, mesmo
sem gostar: existe um bicho faminto e intolerante dentro de cada um de nós. Um animal
irracional e violento, bruto, impetuoso, preocupado exclusivamente com sua
sobrevivência, desprovido de tudo aquilo que acreditamos nos tornar humanos.
A história de Alencar e Jorge é, também, a
história de todos os homens que deixaram para trás sua civilidade e sua
compaixão, e mesmo assim continuam infiltrados no coração de uma sociedade
aparentemente organizada, instituída e solidária – a sociedade onde eu e você
vivemos, e onde nos sentimos muito, muito seguros.
Livre para
ser Preso
incomoda porque é legítimo, fidedigno, visceral e cruel.
Não espere por uma história aventureira, extravagante,
cheia de monstros improváveis, final feliz e efeitos literários especiais.
Temos aqui uma narrativa real e desconcertante
sobre tudo aquilo que uma criatura é capaz de fazer e de sentir, e até que
ponto é capaz de chegar, quando não tem mais nada a perder.
Dê uns goles deste vinho, acomode-se neste sofá e tenha uma boa excursão pelos caminhos sombrios e regelados percorridos por estes dois homens, que se libertaram das amarras que nos mantém presos àquilo que chamamos de civilização.
Dê uns goles deste vinho, acomode-se neste sofá e tenha uma boa excursão pelos caminhos sombrios e regelados percorridos por estes dois homens, que se libertaram das amarras que nos mantém presos àquilo que chamamos de civilização.
Mas se aceita um conselho, caro leitor, não
embarque nesta leitura delirante antes de dormir ou de comer.
O resultado pode ser desastroso, como
desastrosos somos todos nós.